Brasil registra mais de 300 mil vítimas de acidente no trânsito na última década
Lei permite que condutores sejam apenas penalizados com multa ao se recusarem a realizar o teste do bafômetro
Foto: Reprodução
Acidentes recentes no trânsito causaram comoção no Brasil com fatalidades inesperadas. Casos como o motorista de um carro de luxo que atingiu a traseira de um carro, causando a morte de um motorista por aplicativo, mostram como muitas vidas são perdidas no trânsito brasileiro. O caso ganhou ainda mais repercussão após o motorista da Porsche ser liberado pela polícia ainda no local do acidente, que foi registrado em vídeo.
Dados alertam que, na última década, quase 300 mil brasileiros perderam a vida no trânsito, colocando o país como o terceiro que mais mata no trânsito. Inúmeras vidas são perdidas por ano, deixando um rastro de dor e sofrimento para as famílias afetadas.
Legislação
Em muitos casos, o principal motivo do acidente é o consumo de bebida alcoólica. A lei prevê detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, para quem for flagrado dirigindo sob o efeito do álcool.
O advogado criminalista Manoel Amorim alerta que existem casos em que o causador do acidente se recusa a realizar o teste do bafômetro, e o número dessas ocorrências vem aumentando nos últimos anos no Brasil. “Muitos motoristas utilizam de uma brecha na legislação. O Código de Trânsito Brasileiro, no artigo 277, afirma que todo condutor envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de investigação seja submetido ao teste do bafômetro. Desse modo, se um motorista for parado e se recusar a realizar o teste, a recusa deveria presumir que ele fez o uso. No entanto, o parlamento modificou este trecho. O verbo "ser" e "será submetido" foi substituído pelo "poderá ser", no texto da Lei nº 12.760, de 2012”, alerta o profissional.
Essa pequena alteração permite que o condutor do veículo que esteja minimamente informado possa se recusar a realizar o teste do bafômetro. Ao se recusar a realizar o teste, o condutor é autuado apenas por infração gravíssima, com o valor da multa multiplicado por dez vezes, além da suspensão do direito de dirigir por 12 meses.
Caso do motorista da Porsche
No caso do motorista da Porsche em São Paulo, registrado por vídeo no dia 31 de março deste ano, o condutor do carro de luxo, Fernando, foi indiciado por homicídio por dolo eventual (por ter assumido o risco de matar Ornaldo), lesão corporal (por machucar Marcus) e fuga do local do acidente (para não fazer o teste do bafômetro da Polícia Militar (PM), que poderia detectar se ele bebeu e dirigiu).
Por não realizar o teste do bafômetro em seguida ao acidente, não foi possível constatar que o causador do acidente estava sob o efeito do álcool no momento da ocorrência. Testemunhas ouvidas na investigação afirmaram que o empresário havia bebido momentos antes da fatalidade.
A defesa do empresário alegou que ele não ingeriu bebida alcoólica antes de dirigir o veículo. Afirmou ainda que Fernando guiava o Porsche "um pouco acima do limite" para a via. A namorada de Fernando também negou que ele tenha bebido.
Fernando pagou uma fiança no valor de R$ 500 mil imposta pela Justiça como garantia de eventuais indenizações às famílias da vítima e do rapaz que sobreviveu.
Mesmo com o pagamento da fiança, Fernando segue preso em uma penitenciária de São Paulo, aguardando pelo julgamento do caso.
Caso Kátia Vargas
Em outubro de 2013, os irmãos Emanuel e Emanuelle Gomes morreram em um acidente de trânsito com a médica Kátia Vargas, em Salvador. Os irmãos estavam em uma motocicleta envolvida em um acidente com o carro dirigido pela oftalmologista.
O caso repercutiu na época do acidente, por conta da liberação da médica da prisão após passar por alguns dias presa e ser inocentada na Justiça em seguida. Testemunhas disseram que Kátia Vargas saiu com o carro e fechou a passagem da moto pilotada por Emanuel, que levava a irmã na garupa, no sentido Rio Vermelho.
Após parar no sinal, Emanuel teria protestado contra a atitude da médica, batendo com o capacete contra o capô do carro. Foi quando o sinal abriu para a moto, mas não para o carro da médica, que faria um retorno no sentido Jardim Apipema.
Segundo as investigações, Kátia furou o sinal vermelho e acelerou o veículo em direção à motocicleta. Então Emanuel perdeu o controle da direção e se chocou contra o poste, em alta velocidade. Ele e a irmã morreram na hora. Após o impacto, a médica chegou a entrar na contramão e bateu, alguns metros à frente, no portão do Ondina Apart Hotel.
A médica ficou internada no Hospital Aliança após o acidente e saiu de lá direto para o Presídio Feminino de Salvador, na Mata Escura, onde ficou presa por 58 dias, até ter o alvará de soltura concedido pela Justiça.
Após o acidente, o Ministério Público denunciou a médica por duplo homicídio duplamente qualificado, por impossibilidade de defesa das vítimas e pelo perigo comum.
Kátia Vargas foi inocentada em júri popular no ano de 2017. Em 2018, a Justiça anulou o júri que absolveu Kátia Vargas, mas, um ano depois, os desembargadores mantiveram a absolvição da médica.