Futebol para poucos: a elitização dos estádios brasileiros
Entre camarotes e mensalidades, o novo futebol brasileiro distancia o torcedor de suas raízes populares

Foto: Rafael Rodrigues/EC Bahia - Victor Ferreira/EC Vitória
A paixão pelo futebol no Brasil nunca foi um problema para os torcedores, mas hoje em dia, apenas quem tem condições pode vivê-la ao vivo, nas arquibancadas. Desde a Copa do Mundo de 2014, o país viu seus estádios se transformarem em arenas modernas, seguindo o padrão da FIFA, mas também cada vez mais inacessíveis para o torcedor tradicional. Em Salvador, Bahia e Vitória ilustram bem essa mudança: os clubes passaram a cobrar ingressos com valores que, muitas vezes, superam o poder de compra de uma parte significativa de suas torcidas.
Na Fonte Nova e no Barradão, o cenário é semelhante ao de grandes centros do Sudeste. A lógica de mercado se impôs: ingressos cheios são caros e limitados, enquanto o programa de sócio-torcedor se tornou quase uma obrigação para quem quer garantir presença nas partidas. Se antes bastava chegar cedo na bilheteria para comprar uma entrada, hoje a prioridade é de quem paga mensalmente ao clube, um modelo que favorece a receita do clube, mas dificulta o acesso espontâneo ao estádio.
A elitização é um processo que vem sendo denunciado há anos, mas ganhou força com a reformulação das estruturas esportivas para a Copa. Na prática, os novos estádios reduziram o número de lugares populares e aumentaram a oferta de setores mais caros, como camarotes e cadeiras premium. O resultado é que o perfil da torcida mudou: menos povo, mais classe média e consumo.
Muitos torcedores reclamam da forma como os clubes conduzem a situação e acreditam que poderiam atrair mais torcedores utilizando outros métodos. “O Bahia é do povo, então a gente precisa ter ingressos mais acessíveis. É necessário um setor popular para as partidas, com promoções e não apenas em jogos de baixo apelo. O clube precisa dar oportunidade para quem não tem condições de se associar e gostaria de ver um jogo do Bahia”, afirmou Breno Santos, sócio torcedor do Bahia e frequentador da Arena Fonte.
Do lado do Vitória não é muito diferente. “Eu acredito que o Vitória deveria rever os valores cobrados no Barradão. Tudo bem que o plano de sócio eu nem acho tão caro, mas tem torcedor que não consegue se associar, mas gostaria de ver um jogo do time no mês ou até mais a depender do valor. Então, o time precisa atuar mais com promoções, setor popular, para garantir um estádio mais cheio e dar oportunidade ao torcedor”, contou Julia Almeida, torcedora do Vitória.
No caso do Bahia, o acesso à Arena Fonte Nova em partidas de maior apelo, como clássicos e confrontos decisivos, é praticamente exclusivo dos sócios, sem abertura de ingressos para a venda geral. O Vitória, por sua vez, também tem investido em seu plano de fidelização, tornando cada vez mais raro ver ingressos à venda para o público geral em partidas de alta demanda no Barradão.
Mesmo com muitas reclamações sobre os valores cobrados, as torcidas de Bahia e Vitória sempre garantem uma linda festa em seus estádios. Os clubes baianos estão entre os seis clubes do Brasil com a maior taxa de ocupação nos estádios, o que representa um bom momento para o futebol baiano.
O Bahia aparece na segunda posição com 80,3% de ocupação na Arena Fonte Nova. Já o Vitória aparece na sexta colocação com 69,3% de ocupação no Barradão no Campeonato Brasileiro de 2025.
A elitização nos estádios altera a alma do futebol. A festa das arquibancadas, marcada por batuques, cantos e bandeiras, vai perdendo sua identidade popular. Os gritos de incentivo agora ecoam em meio a um público mais homogêneo, menos ruidoso — e, muitas vezes, menos apaixonado.