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Crítica: Tremembé romantiza criminosos e a sociedade aceita

Nova série baseada no presídio Tremembé se passa na linha tênue entre dramatização e romantização

| Autor: Lucca Anthony
Crítica: Tremembé romantiza criminosos e a sociedade aceita

Foto: Divulgação

A nova série da Amazon Prime Vídeo, "Tremembé" vem chacoalhando o cenário do entretenimento no Brasil, por além de ser uma obra que reúne grandes nomes nas telas, fala sobre grandes nomes que ficaram famosos em todo território nacional por conta de seus crimes cometidos. Contando histórias de criminosos que ganharam forte notoriedade nos noticiários como Anna Carolina Jatobá e seu marido Alexandre Nardoni, Sandrão, Elize Matsunaga e principalmente Suzanne Von Richtofen, a série tem como proposta entregar uma história sobre essa pessoas dentro do conhecido presídio dos famosos, o Tremembé. O objetivo visava contar uma história baseado na contada pelo jornalista Ulisses Campbell, no qual escreveu um livro de mesmo nome. 

Entretanto, como tantas outras obras baseadas em fatos reais, "Tremembé" se passa na linha tênue entre trazer a realidade e entregar algo agradável com o público, brincando com o fato de que "pessoas malignas" visto pela sociedade na época de seu crime, talvez não passavam de mais uma vítima. É necessário pontuar que todas as pessoas merecem uma segunda oportunidade, e se tiverem pagado o que devia à Justiça, é necessário respeito e aceitar a ressocialização na sociedade. Porém, o que não pode ocorrer é a banalização dos seus crimes e as dores causadas por essas pessoas, que, depois do lançamento de "Tremembé" vem ocorrendo fortemente nas redes sociais.

BANALIZAÇÃO DO MAL

De acordo com a filósofa alemã Hannah Arendt, a "banalização do mal" existe quando pessoas comuns enxergam o mal dentro da sociedade como algo "comum" / "normal" dentro do dia a dia. Seguindo esse conceito, é possível observar o quão impactante e o quanto se encaixa o tal termo dentro das reações dos internautas aos fatos mostrados e a história contada na série. A produção, inclusive, trabalha muito com a dramatização, demonstrando um drama interpessoal entre os prisioneiros, conduzindo a quem assiste criar uma certa "aproximação" com o representado, desenvolvendo sentimentos como "torcer" e se "preocupar" com o personagem, demonstrando que a produção realmente é boa e convence. A problemática ocorre quando se ultrapassa o limite da ficção presente dentro da tela e passa para a vida real. 

É de conhecimento a bastante tempo que existiram desde o início, fãs dos tais mencionados, mesmo mostrando com provas concretas dos bárbaros crimes que cometeram. Mas atualmente, contando com a evolução da internet, a situação se tornou ainda pior, existindo inclusive "fãs clubes" e "acervos" de Elize Matsunaga e Suzanne Von Richtofen, por exemplo, onde algumas frases como "passo pano" ou "até que ela fez pouco" - no caso sobre o assassinato e esquartejamento do marido de Elize, após uma série de abusos - existirem e serem postadas de forma normal por diversas contas dentro do X (antigo Twitter) (botar os posts).

 

Óbvio, contas e posts podem não passar de somente uma "brincadeira", mas é por conta dessas "brincadeiras" que o ponto defendido por Hannah Arendt se torna tão real, as pessoas perderam a noção do moral e ético, principalmente ao brincar e comentar positivamente sobre crimes hediondos que feriram alguém que se foi e mais ainda, pessoas que ficaram.

O MAL SE TORNOU BOM

Ainda de acordo com a banalização, há também um grande ponto levantado, inclusive, em uma frase dita por Acir, personagem na série: "a desgraça vende". A afirmação se tornou mais verdadeira e real possível, justamente por representar de forma coesa a sociedade atual, onde além de se tornar extremamente polarizada, consome constantemente tragédia, tristeza e muita morte. Com isso, se tornou mais do que normal - novamente, como Hannah falou, esquecer e tornar banal a maldade humana e com isso, existir uma romantização, onde antigos vilões e pessoas ruins, se tornaram heróis na visão pessoal. 

Essa visão de mundo acaba sendo motivada por um "trabalho" já enraizado na sociedade, que existe há muito tempo, como a corrupção, problemáticas dentro de instituições públicas (como educação e segurança) e principalmente a desigualdade social. Devido a isso, situações de violência, desde a menor, até os casos de Tremembé, acabam sendo aceitas e se tornando "naturais" ou inevitáveis. 

E como consequência dessa mudança de pensamento sobre as tragédias cotidianas, há um grande impacto direto na saúde mental da população, causando danos físicos e mentais a indivíduos e comunidades. 

A série 'Tremembé' não passa de uma obra ficcional baseada em fatos reais, não tendo nada de errado. O problema é a forma como ela é vista por algumas pessoas, que, devido ao trabalho de Ulisses Campbel, começa a dar palco aos crimes violentos cometidos pelos personagens / pessoas reais que viveram o que está sendo retratado, sendo extremamente errado e preocupante.

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