Bebê Reborn: Quando o realismo ultrapassa o bom senso
Casos extremos levantam debates sobre saúde mental, limites sociais e o conceito de maternidade

Mulher segurando um bêbe no colo |Foto: Freepik
Os bebês reborn surgiram como uma forma artística de representação hiper-realista de recém-nascidos. Geralmente feitos à mão, com detalhes tão minuciosos que chegam a se confundir com um bebê real, eles encantam colecionadores, artistas e até terapeutas em diversas partes do mundo.
Porém, o fascínio pelo realismo tem, em alguns casos, ultrapassado os limites do bom senso, levantando debates éticos, emocionais e sociais.
Recentemente, uma mulher de Salvador decidiu processar a empresa onde trabalhava após ser alvo de chacotas dos colegas ao pedir licença-maternidade para cuidar de um bebê reborn. Ela entrou na Justiça solicitando 120 dias de licença, além do recebimento do salário-família, alegando que considera o boneco hiper-realista como sua filha.
A empresa negou o pedido, argumentando que a funcionária não é, de fato, mãe. Além disso, ela teria sido constrangida diante dos colegas, quando um superior comentou que ela “precisava de um psiquiatra, não de um benefício”.
Outros casos relatam mulheres levando os bonecos para serem atendidos em postos de saúde ou até mesmo para serem batizados em igrejas.
Mas o que leva uma pessoa a se apegar de forma tão intensa a um boneco, acreditando que ele seja realmente seu próprio filho?
Pesquisas apontam que segurar um bebê — mesmo que seja um reborn — estimula hormônios ligados ao apego, como a oxitocina, promovendo sensações de bem-estar e vínculos emocionais profundos. Pessoas que sofrem de ansiedade ou depressão relatam alívio significativo ao interagir com esses bonecos.
Segundo a psicóloga Dra. Jessica Zucker, os reborns podem funcionar como uma “forma terapêutica de lidar com o luto” após perdas gestacionais, carregando o “peso simbólico” de um objeto que acolhe emocionalmente.
A psicóloga Dra. Brenda Suely afirma que, além da função terapêutica, o recente estouro da popularidade desses bonecos também se deve à força midiática, como a influência de celebridades que apareceram publicamente com bebês reborn. Ela complementa dizendo que, para muitas pessoas, os bonecos são de fato utilizados como instrumentos terapêuticos.
Existe um fenômeno conhecido como Teoria do Apego, proposta por John Bowlby, que afirma que o ser humano desenvolve vínculos com quem oferece cuidado e segurança. No caso dos reborns, mesmo sendo objetos, o cuidado dedicado a eles pode ativar o sistema de apego e gerar conforto emocional.
O apego intenso aos reborns é uma fusão complexa de fatores emocionais, hormonais e psicológicos: luto, trauma, carências afetivas e mecanismos biológicos de apego. Para muitos, trata-se de um recurso terapêutico legítimo e eficaz — mas, quando passa a representar uma fuga da realidade, pode indicar a necessidade de acompanhamento profissional.
Como qualquer forma de cuidado emocional, o uso de bebês reborn exige equilíbrio. Entre o conforto terapêutico e a desconexão do real, há uma linha tênue que, quando ultrapassada, pode refletir dores profundas que merecem acolhimento, e não julgamento.