Piloto alertou sobre falha antes de tragédia da Voepass, mas problema foi ignorado, diz ex-funcionário
Sistema de degelo falhou antes do voo que matou 62; manutenção não foi feita, segundo denúncia

Foto: Fábio Passalacqua
Horas antes da queda do avião da Voepass que matou 62 pessoas em Vinhedo (SP), em 9 de agosto de 2024, o sistema de degelo da aeronave já havia apresentado falhas. A denúncia foi feita por um ex-auxiliar de manutenção que acompanhou a última revisão do ATR 72-500, modelo envolvido no desastre.
Segundo o relato, o comandante que pilotou a aeronave na noite anterior, em um voo vindo de Guarulhos para Ribeirão Preto, alertou verbalmente sobre um erro técnico. "Essa aeronave nunca tinha apresentado esse tipo de falha, né? Só que no dia do acidente, quando essa aeronave chegou de Guarulhos para Ribeirão, ela foi reportada verbalmente pelo comandante que trouxe ela. Foi alegado que ela tinha apresentado o airframe [fault] (alerta emitido quando há problema no degelo) durante o voo. E ela estava desarmando sozinha. Ele acionava [o sistema] e ela desarmava. Coisa que não poderia acontecer”, disse o ex-funcionário em entrevista ao g1.
Apesar do alerta, o problema não foi registrado no diário técnico da aeronave (TLB), contrariando o Regulamento Brasileiro de Aviação Civil, que exige pleno funcionamento do sistema de degelo em voos com risco de formação de gelo.
O ex-auxiliar afirma que havia uma cultura na empresa de evitar registros formais para não atrasar as operações. “Ela [a aeronave] chegou por último, por volta de meia-noite e meia, quase uma hora, e 5h30 da manhã ela já tinha que estar lá em cima para poder assumir voo. É um período muito curto para ser feita manutenção na aeronave. Era a própria diretoria que exigia isso, queria o avião voando. Então assim, eles nem pesquisaram [o problema no sistema de degelo]”, relatou.
Ele ainda afirmou que a empresa só autorizava manutenção quando havia registro oficial. “O próprio líder questionou: 'bom, se ele não reportou em livro, não tem pane na aeronave'. Esse era o legado da empresa: se o comandante reporta, tem ação de manutenção; se não reportou, eles não vão perder tempo com nada que ele falar", acrescentou.
As investigações do acidente apontaram que, durante o voo entre Cascavel (PR) e Vinhedo (SP), o sistema de degelo foi ativado três vezes. Dados da caixa-preta reforçam a suspeita de falha no equipamento, considerada crítica para segurança em voos sob risco de congelamento. As apurações seguem em andamento.